sábado, 17 de dezembro de 2016

Inéditos, por Elita Guerreiro


“A BARCA DOS CONDENADOS”

Cada um tem seu inferno
Que não consegue evitar,
O drama não é moderno
Mas difícil de aceitar!
Aos grandes nada lhes falta
Querem sempre mais e mais,
Mas a morte que é madrasta
Torna-nos a todos iguais!


Todos nós somos actores
Nos autos de Gil Vicente,
Grandes, humildes. doutores,
Culpados ou inocentes!
E lá vai pelo mar fora
A barca dos condenados,
Meu Deus que grande demora
Para os que foram julgados!


Uns sorriem outros choram
Revoltam-se os arrogantes,
Há muitos que imploram
Outros que ficam expectantes!
E o “demónio” a tentar
Meter-nos na sua barca,
Sem o “anjo” nos julgar
Cada um por sua falta!


Elita Guerreiro*28/11/2016


“O NEVOEIRO DA HISTÓRIA”

Se o nevoeiro se adensa
E não se vê “palmo de chão”,
O povo na sua crença
Lembra D. Sebastião!
O moço Rei sonhador
Que em Alcácer lutou,
Com denodo, com ardor
E que a vida lá deixou!

Faiscavam as espadas nuas
Brilhantes como tesouros,
Boas intenções as suas
Mais fortes eram os Mouros…
Nem pensar em desistir!
O sonho ainda era lei,
Porém Alcácer Quibir
Deixou Portugal sem Rei!

Longos anos se passaram
Dum silêncio sepulcral,
Dos muitos que lá ficaram
Um conseguiu regressar:
D. João de Portugal,
Nobre fidalgo de Almada,
Tudo perdera afinal
Já lhe não restava nada!

Cansada de esperar,
A mulher que tanto amou
Acabou por se casar
E o seu mundo desabou!
Outra batalha perdida
A última para D. João,
Tudo perdera na vida
Até mesmo o coração!


Elita Guerreiro* 6/12/2016

“ A VERDADE E A MENTIRA”

Nem sempre é bem aceite
A verdade que se sente,
Há até quem se aproveite
Do talento de quem mente!

A mentira é sempre feia
Por muito que se enfeite,
Embaraça e enleia
E nem sempre é bem aceite!

A verdade faz sofrer
Porque é forte e exigente,
Só assim dá para entender
A verdade que se sente!

Quem se vicia em mentir
E que a verdade rejeite,
Já não sabe distinguir
Há até quem se aproveite!

Há quem minta toda a vida
E diga até que nunca mente,
E há quem se sinta atraída
Pelo talento de quem mente!


Elita Guerreiro 5/5/2016


“QUEM ME DÁ NOVAS DE MIM”

Teimosamente teimando
Não vou lá nem fico aqui,
Fico comigo pensando
Se estou cá ou se parti!

Se nem sequer sei de mim
Que me serve perguntar
Por vós, ou qual será o fim
Ou se vos vou encontrar?

Podeis falar e teimar
Mas senhora, nem eu sei
Se este amor me vai matar
Ou se às vossas mãos morrerei!

Quem me irá encontrar
Quando tão perdido estou,
Se vós me não quereis achar
E nem eu sei onde estou!...


Elita Guerreiro, 9/3 /2016


UM ABRAÇO UNIVERSAL


Sou irmã do rio que corre
Entre vales mansamente,
E do sol que à noite morre
E de manhã volta novamente.
Sou irmã do rouxinol
Que canta à noite no silvado
E quando nasce o sol
Se aquieta calado.

Sou irmã da erva verde
Que cobre o vale infinito,
Que ao longe se perde
Junto ao azul do céu bendito.
Sou irmã da onda forte
Que se desfaz na areia,
Da chuva do vento norte
Da lua na maré cheia.

Um mundo feito de cores…
Que posso desejar mais
Do que o perfume das flores
E o chilrear dos pardais?
Sou filha da Mãe- Natureza,
O meu Pai é o Universo,
Estou entre ambos “presa,”
Neste abraço terno imenso.

Elita Guerreiro * 22/4/2018


VARANDAS DE LUA


No meu bairro há uma rua
Com varandas onde a lua
Vem espreitar indiscreta
Por cada fenda aberta!
Há uma de que mais gosta
Mais aberta, mais exposta!
Lá dentro brincam crianças
E os seus sorrisos de esperanças
Enchem a sala toda
Com suas danças de roda…
Pássaros que abrem as asas
Que mesmo sem sair das casas
Dão brilho à minha rua
Que tem varandas de lua!

Elita Guerreiro, 5/2/2019




A VIDA ESCRITA A TINTA VIOLETA

Na gaveta entreaberta
Que se não pode fechar,
Fiz uma descoberta
Que não resisto a contar!
Escrito a tinta violeta
Um envelope amarelado
Tinha uma borboleta
Como um selo, colado!

Ao tocá-la de mansinho,
As asinhas delicadas
Esfumaram-se em remoinho
E delas não restou nada!
Havia uma folha de hera
O desenho dum coração,
E a palavra Primavera
Seguida de: “sem perdão.”

Não sei precisar o ano
Ou o nome de quem escreveu,
Mas a mágoa e o desengano
Estavam lá… Quem as sofreu?
Há quanto tempo esquecida
Dentro daquela gaveta,
A história duma vida
Escrita a tinta violeta?


Elita Guerreiro * 25/9/2018



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