(AQUANDO DA PARTIDA DAS “NAUS PARA A INDIA”)
Nestas estrofes, Vasco da Gama conta ao Rei de Melinde,a partida das naus para a Descoberta do caminho Marítimo para a Índia
D. Manuel I remunerou todos os navegadores e dirigiu-lhes palavras nobres e estimulantes, para
que eles tivessem mais amor pelos trabalhos, que viessem a executar durante a expedição.
(Camões faz uma comparação erudita e mitológica entre os navegadores portugueses com uma
vontade heróica de chegar à Índia e os Mínias com a sua nau Argos, que Jasão mandou construir para ir em busca do «Velo de Ouro».) **
NOTA: -**tinha a ver com as expedições gregas às costas do Mar Negro (Euxínio), que eram muito difíceis de contornar, em busca do ouro que a Grécia não possuia.
(Estrofe 83)
Foram de Emmanuel remunerados V.1 com palavras altas animados V.3
para quantos trabalhos sucedessem V.4
Assim foram os Mínias ajuntados, V.5
para que o Véu dourado combatessem, V.6
Tentar o mar Euxinio, aventureira. V.8
Estavam as Naus breves a zarpar e, sem medo e com ânimo juvenil, os marinheiros e os soldados estavam prontos a seguir Vasco da gama naquela aventura.
(Estrofe 84)
“E já no porto da ínclita Ulisseia V.1
(Onde o licor mistura e branca areia V.3
C ’o salgado Neptuno o doce Tejo) V.4
As naus prestes estão; e não refreia V.5
Porque a gente marítima e a de Marte V.7
Estão para seguir-me a toda a parte. V.8
Nesta estrofe, Camões designa Lisboa, como a afamada Ulisseia e fala do nobre alvoroço que aí se vive e que corresponde ao desejo de partir. Localiza-a espacialmente no sítio em que o Tejo une as suas águas (licor... e branca areia) às do oceano (referência mitológica a Neptuno.
Pela praia os soldados avançavam com os seus fatos de várias cores e de várias maneiras, aparentando toda a sua força e energia para descobrirem outros mundos. As robustas Naus baloiçavam ao sabor de ventos calmos, e erguiam-se bem alto os estandartes pressagiando um final glorioso e imortal (ser no Olimpo estrelas como a de Argos).
NOTA: (Segundo a Mitologia, a nau Argo foi colocada por Minerva entre as constelações do Universo).
"Pelas praias vestidos os soldados V.1
De várias cores vêm e várias artes, V.2Para buscar no mundo novas partes V.4
Nas fortes naus os ventos sossegados V.5
Ondeam os aéreos estandartes; V.6
De ser no Olimpo estrelas como a de Argos. V.8
Vasco da Gama continua a descrição da partida fazendo realçar a parte física e psíquica dos
navegadores.
Apesar de eles terem comparecido com os seus melhores trajes, conforme a viagem pedia e de terem o moral elevado, também tinha que lhes preparar a alma para os perigos, que a partir dali começariam . Ele próprio com os olhos já cansados, pediu a Deus que os guiasse e os favorecesse desde início, pois todos os marinheiros andam sempre com a morte pela frente.
(Estrofe 86)
“Depois de aparelhados desta sorte V.1
Aparelhamos a alma para a morte, V.3Para o sumo Poder que a etérea corte V.5
Sustenta só com a vista veneranda, V.6
Imploramos favor que nos guiasse, V 7
Sairam do templo que está junto ao mar, na Praia de Belém, (com o mesmo nome da terra em que Deus foi encarnar (nascer), e olhando bem para o Rei de Melinde, conta ao Rei como foi afastado daquelas praias levando dentro de si dúvidas e receios, dificilmente retendo as lágrimas.
NOTA: Aqui Camões faz uma “perífrase”(circunlocução ou rodeio), para fazer um paralelismo entre Belém da Judeia onde Cristo nasceu e Belém de Lisboa de onde eles iriam partir.
(Estrofe 87)
“Partimos assim do santo templo V.1
Que o nome tem da terra, para exemplo, V.3
Donde Deus foi em carne ao mundo dado. V.4
Cheio dentro de dúvidas e receio, V.7
Que apenas nos meus olhos ponho o freio V.8
Naquele dia, a gente da cidade incluindo amigos e familiares dos navegadores e os estranhos que queriam assistir à partida dos mareantes, acercaram-se da praia, para fazerem as despedidas. Os marinheiros vinham já saudosos e tristes das suas famílias ali presentes. Juntamente com os religiosos que os iam acompanhar na viagem, seguiam em procissão solene para as naus, enquanto rezavam a Deus.
Estrofe (88)
"A gente da cidade aquele dia, V.1
(Uns por amigos, outros por parentes, V.2
Outros por ver somente)concorria, V.3
Saudosos na vista e descontentes. V.4
Em procissão solene a Deus orando, V.7
Para os batéis viemos caminhando.” V.8
(Estrofe 89)
“Por perdidos as gentes nos julgavam; V.2
As mulheres c’um choro piedoso, V.3
Os homens com suspiros que arrancavam; V.4
Mães, esposas e irmãs, que o temeroso V.5
De já nos não tornar a ver tão cedo. V.8
O Capitão continua a sua narrativa, descrevendo com precisão alguns dos epísódios que não lhe
passaram, de todo, desapercebidos:
Uma velha mulher fala para o seu filho perguntando-lhe porque sendo ele o seu amparo
na velhice, agora a abandona para ir morrer no mar...
Outra, descabelada de desespero, falando com o seu marido, cuja ausência não sabe suportar,
pergunta como pode ir aventurar-se no mar, deixando-a, e como é possível trocar o amor que os une para seguir um caminho para ele desconhecido...
O choro das mulheres era seguido pelo de velhos e meninos, todos compartilhando aquela dor. A
comoção era tanta, que até os próprios montes respondiam a tal clamor. As lágrimas eram tantas
quantos os grãos de areia da praia.
NOTA: Camões nesta frase faz uma hipérbole muito sugestiva da dor em comum.
Ao ouvir aqueles clamores, o Gama determinou que os marinheiros e soldados se apressassem a partir sem as despedidas (habituais), a fim de evitarem arrependimentos de última hora.
(Estrofe 90)
“Qual vai dizendo: - “Ó filho, a quem eu tinha V.1
Só para refrigério, e doce amparo V.2
Por que me deixas mísera e mesquinha? V.5
Onde sejas de peixes mantimento!” - V.8
(Estrofe 91)
“Qual em cabelo: -“Ó doce e amado esposo, V.1
Por que is aventurar ao mar iroso V.3
Essa vida que é minha, e não vossa? V.4
Como por um caminho duvidoso V.5
Vos esquece a afeição tão doce nossa? V.6
(Estrofe 92)
“Nestas e outras palavras que diziam V.1
Os velhos e os meninos as seguiam, V.3
Os montes de mais perto respondiam, V.5
A branca areia as lágrimas banhavam, V.7
Que em multidão com elas se igualavam. V.8
(Estrofe 93)
“Do propósito firme começado, V.4
Determinei de assim nos embarcarmos V.5
Sem o despedimento costumado, V.6
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