*O JANTAR DO BISPO*
Trajetória e
Estrutura Narrativa do Conto de Shophia de Mello Breyner Andresen através da
Casa e dos comportamentos das suas Personagens
1ª. PARTE (A Casa)
A).
– Descrição da Casa-: GRANDE,
BRANCA, ANTIGA
Características Materiais
- O
Tamanho e a Cor
Características
Temporais
-
Antiga
- Os três adjetivos revelam a solidez física da
casa e dos seus habitantes
B)
– Enquadramento da Casa
-
Em frente à Casa - Pátio Quadrado
(forma geométrica);
- À direita - Um Laranjal e uma Fonte onde corre água
dia e noite
(Símbolo
- de Cor e Movimento);
- À Esquerda
- Um Jardim de Buxo, Húmido e Sombrio
com Camélias e Bancos
de Azulejos
(contraste - de Cores e Texturas);
-
A Meio da Fachada - Descia uma
Escada de Granito coberta de Musgo
(o Musgo
simboliza a Antiguidade, é um Ícone da paragem no Tempo);
Frente à Escada -Do outro lado do Pátio, existia um Grande Portão
que dava
para a Estrada
Transição entre a Casa e o Mundo – (Símbolo
- de Movimento).
O espaço visto das
Janelas
- Em 1º. Plano: - os Pomares e os Campos
- Em 2º. Plano: - o Rio, a Várzea Verde, os
Montes Azulados, que em certas tardes,
ficavam roxos.
(as Janelas são aqui, também, um elemento
de “transição, do Interior para o
Exterior”)
A Natureza está sempre presente, parecendo um “Quadro sem Tempo,” (definindo a
VINHA) que
está relacionado com as diferenças sociais entre o mundo dos ricos, (a Vinha) e o mundo dos pobres (o Trabalho na vinha). Diz o ditado: «Quanto mais pobre
é a terra, mais rico é o vinho»
Enquanto “no exterior se falou só da Casa”, no interior” vai-se
falar de pessoas.
O JANTAR
O Dono da Casa
resolve dar um jantar, para o qual convida familiares, amigos e o Bispo
ao qual deseja fazer
um pedido. “Nessa noite está uma Tempestade
muito grande.
Parecia que o Caos tinha descido à Terra”; a estrada estava
cheia de água e lama.
O ambiente dentro
de casa era mais quente e festivo, tinha:
Conforto - (calor, da
lareira acesa);
Autoridade – (o Dono da Casa
ocupa uma posição central);
Proximidade – (Familiares e
Vizinhos mais chegados).
Dono da Casa – (Símbolo da Autoridade e Riqueza)
1.- Reclama o
respeito pela ordem, tudo obedece a uma hierarquia. Para ele, “o lugar
dos
miseráveis fica um pouco abaixo do dos criados, um pouco acima dos cães;
2. – Vive das “aparências, do
novo-riquismo e da autocontemplação”
3. – Aos sábados “dá esmola e comer
aos pobres” que batem à porta, mas não podem ser
daquela zona. Aos
Domingos “vai à
Missa”, e tem na Igreja um “banco especial
para ele”.
4. – Não suporta “os
sermões” do novo Padre de Varzim; “vê nele um perigo constante à sua autoridade”e pensa arranjar maneira “de se livrar dele”.
Padre de Varzim – (Situa-se
no Plano Espiritual)
2.- Abandonou “a riqueza para
ser pobre” e “reclamar direitos e regras” para todos aqueles que são explorados pelos ricos.
3. – Contrariamente aos padres anteriores, caracteriza-se pela
sua “caridade, piedade e
generosidade”.
4. – Nos sermões de Domingo, “fala duma justiça, que não é a justiça do Dono da Casa”.
Estas duas condutas levam ao elemento
fundamental: a “Intriga” entre
os dois, que para o Dono da Casa se torna uma grande dificuldade a ultrapassar,
que é tanto maior, quanto “a fama do
Padre de Varzim é grande”. (Simbolicamente, é uma batalha entre “o Bem e o Mal”)
O Bispo
Viaja
vagarosamente, dentro do seu carro, vai a caminho do jantar pensando na forma
como deve abordar o Dono da Casa, para lhe fazer um pedido. Está uma noite de
Inverno com “chuva e lama”, o que o leva
a dirigir-se à Casa, pesado e lentamente, mas ainda consegue “comover-se” com
a beleza pura e antiga das paredes e pedras.
1.-Está numa
situação “paralela
à do Dono da casa”;
2.-Ele tem também “um pedido a fazer”;
3.-Pedir é uma
coisa difícil, principalmente quando se trata “de pedir ao Rico e Poderoso”;
4.- Tenta “angariar fundos”
para o restauro do tecto da igreja;
5.- Tem uma
estratégia, que consiste “em estimular a vaidade” do Dono da Casa;
6.- “Lamenta” recorrer a tal recurso.
Quando
a conversa entre o Dono da Casa e o Bispo ia começar, surge um novo acontecimento:
a chegada “estrondosa e estranha” dum
desconhecido, cujo carro avariou, junto ao portão quando seguia para a cidade.
Então, o Dono da Casa convidou-o para ser seu hóspede e jantar.
Homem Importante (Símbolo do DIABO)
1.- Vem num “carro
preto e sumptuoso”; é “alto e
direito, com sobretudo escuro”;
2.- “Indiferente”
à chuva,
atravessa o pátio;
3.- “Causa
grande efeito” nos convidados”;
4.- Ao
jantar faz“ um
discurso sentencioso”, que todos ouviram suspensos;
5.-.Graças à sua “argumentação,
consegue a resolução da Intriga”, como se fosse um hábil advogado. (nota: enquanto o Dono da Casa ficou feliz,
o Bispo sentia o espírito confuso e pesado)
Dois Cheques de
50 contos foram passados. Um pelo Dono da Casa, o outro pelo Homem Importante, e “assim fecharam o negócio”:
- “Tecto novo na
Igreja”
- “A venda do
Padre de Varzim” (a transferência do padre
para outro lugar)
O Filho do Dono
da Casa
Para
o João, uma criança de 9 anos, o Homem Importante só existe enquanto “sombra ameaçadora”.O
João “não gosta daquele homem”, que só enchia
os tectos “assemelhando-se
a um Polvo.” (estas imagens só a criança via) Nessa altura, o Homem Importante, sabendo que criança não
gostava dele, diz-lhe: - “Quando fores
mais velho, talvez venhas a gostar de mim”.
2ª. PARTE (Na Cozinha)
OS CRIADOS
Gertrudes – (A
cozinheira)
-
Hostil, Autoritária e Desconfiada
Joana - (A criada Idosa)
-
Acolhedora e Vencida
Criados da sala - (Homem e
Mulher)
- Submissos (seguem à risca todas as ordens da casa)
Criada de Quartos
- Amarga
e Resmungona
Lá
fora, a Tempestade continuav
- Relâmpagos
e Trovões ribombavam -
-
O Pobre - (Símbolo
de DEUS)
Bate
à porta da Cozinha, o que deixa Gertrudes irritada, pois já tinha arrumado e
limpo tudo, e além disso “a esmola e a comida só eram dadas aos
sábados”, mas mandou-o entrar e indicou-lhe o lugar dos “mendigos”,
perguntando-lhe ao que vinha. O Pobre queria falar urgentemente com o Dono da Casa, vinha da parte do
Padre de Varzim.
Pediu
a todos os Criados e “Todos lhe negaram o pedido”: tinham visitas pelo
que o Dono da casa não podia ser interrompido;
A TROVOADA
– “Aumenta progressivamente “a cada negação” que o Pobre vai recebendo, ao ponto do
Criado da sala lhe dizer: «”O Mundo é
como é, temos de ter paciência». (Símbolo - a “Submissão”)
Até
a própria Gertrudes diz: «escusa de
pedir mais, já viu que ninguém o atende».
Neste
momento, um relâmpago enorme deixa toda a casa sem luz, e a velha criada Joana assusta-se,
e inicia uma reza, “a Magnífica”, e
põe em primeiro lugar a personalidade do Pobre, que
era a única pessoa, que lhe preenchia as falhas de memória.
João, filho do Dono
da Casa, partilha a beleza do relâmpago
e o crescente medo que vai sentindo.
Quando
João chega à cozinha, “a trovoada
afasta-se” (Símbolo - da Bondade e Inocência
da criança).
Ele
é o único que aceita levar o recado ao pai, (é uma atitude positiva). Nesse momento dá-se o regresso da Luz, (faz
com que a criança veja de novo a sombra do Homem Importante), e regresse ao Medo, que tem dele.
Mesmo
com a interferência do Bispo, o Dono da Casa não aceita o pedido insistente
do filho para ir falar com o Pobre, (representa uma
“negação”)
O
Pobre resolve abrir a porta e ir embora, sem ter tocado no que lhe fora
servido.
A reflexão final de Joana “também Deus não
recebeu” confirma o Simbolismo do Bem e do Mal, que
se encontra na referência à “Alegoria
Bíblica Caim/Abel.”
3ª. PARTE (O Bispo vai a caminho de sua casa)
-
Sentia a sua “Mente obscura” (Símbolo- Peso e Confusão)
-
Sentia-se “Só entre os Homens (Símbolo - o não saber lutar no Mundo dos Negócios);
-
Não sentia nenhum “sinal” que o
ajudasse (Deus
estava Oculto e Velado);
-
O seu “estado de
Alma” era negro como negra era a Estrada (Símbolo - das “Trevas”);
-
Vai “torturado pelo remorso,” (Símbolo - a Curva da Estrada)
pois tinha achado estranha a forma como o Homem Importante o ajudara a resolver
o seu assunto, “estando de acordo em
retirar o Padre da aldeia;
-
Depois da curva, a estrada era a direito (Símbolo - da Lisura ou Honradez);
- Na estrada ,um
pouco ao longe, vê um “Vulto” que identifica como sendo “o “Pobre esfarrapado” que esteve na Casa Grande, para falar com o Dono da Casa;
Pára
o carro, e chegando-se ao vulto, o Bispo olhou-o. Era um homem igual a tantos outros,
trazia a fome
estampada na cara. Nas mãos havia um gesto de paciência, parecia ao Bispo que todo o Abandono, toda a Solidão e todo o Sofrimento
do Mundo olhavam para ele, então baixou os olhos, e ao levantá-los ia perguntar se
queria boleia para a aldeia, que ainda era longe… “ficou perplexo,“ deixou de ver a figura, ela esfumara-se,
tinha desaparecido
«DEUS no Céu teve dó daquele Bispo, porque ele
estava “só e perdido” e, não sabia lutar contra os hábeis discursos dos donos
do Mundo.»
FINAL DO CONTO
O
Bispo volta para trás e leva o carro até á Casa Grande, para junto do dono denunciar a
acusação de que nessa noite fora vítima o Padre de Varzim afirmando, que “o próprio Deus veio ser sua
testemunha”. O Dono da Casa não acreditava nas palavras, que ouvia,
o Bispo queria desfazer o pacto e devolver os dois cheques, provocando “o furor, o espanto e a indignação do Dono
da Casa”. Este encarregou um
criado de ir chamar o Homem Importante, mas tanto ele como o motorista e
o carro tinham desaparecido, o mesmo
acontecendo com o cheque que ele próprio tinha dado ao Bispo. Toda esta
situação cria inquietação e mau estar no
Dono da Casa; todos os criados procuram o dito cheque e crêem que «o Diabo o levou».
CONCLUSÃO
«Tudo o que se
passou neste conto representa um Duelo entre os Valores de Progresso e os
Valores impostos pela Tradição.»
Ou:
No
imaginário da Autora, será «Uma “Alegoria”
da luta entre Deus e o Diabo ou a luta entre o Bem e o
Mal.»
Madeira,
22.01.2016
Carmo Bairrada
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