“O CAMINHEIRO”
Naquela
noite escura como breu,
caminha
lentamente pela serra, um vulto.
Com seus
passos pesados
vai
pisando as folhas secas,
há muito
caídas no chão…
O
CAMINHEIRO
Leva
consigo alguém,
Que
não sabe, nem vê.
Vai
junto a si, protegendo-o.
Lá
vai caminhando sem rumo…
O
CAMINHEIRO
Continua
andando, andando
pela
serra, por trilhos escondidos,
seus
companheiros de caminhadas…
O
CAMINHEIRO
Já
sente o vento forte, frio e implacável
que
vai fustigando as velhas árvores.
que
choram de mansinho fazendo lembrar,
o
som do mar lá ao longe…
O
CAMINHEIRO
Continua
o seu caminho.
Veste
um capote até aos pés,
e
na cabeça um grande chapéu,
que
o cobre até aos olhos…
A
noite já vai longa e gélida.
através
das núvens turbulentas,
que
teimam em ficar.
A
sua luz forte reflete-se na floresta, e
Surge,
então, um um monte de pedras.
O
CAMINHEIRO
Dum
só salto, sobe-o e grita:
-
São horas de regressar!
-
Para onde? – pergunta-lhe uma voz…
-
Não sei!
Só sei
que tenho de chegar…
Azeitão,
Setº. 2015
Carmo
Bairrada
A
Caminhada…
Sempre
pensei que um dia começaria a caminhar sem destino.
É
manhã, muito cedo, porém a praia já acordou. Dou início ao meu caminhar nesta
manhã.
Por
trás de mim, o sol por mim amado inunda-me com o seu calor da cabeça aos pés.
Ritmados, os pensamentos acompanham a cadência dos passos ao longo da avenida.
O mar ali em baixo mesmo ao lado. No grupo de palmeiras, as cigarras
presenteiam-me com o seu canto alegre e descuidado. Em franca competição comigo,
a sombra que me é fiel também caminha, apressada.
Cruzo-me
com alguém que também caminha sozinho em sentido contrário e interrogo-me quais
as motivações que cada um tem para encetar o seu caminho?...
No
peito, o coração bate apressado.
A
avenida já ficou bem lá atrás . É hora de regressar. Deixo para lá o marco
branco, onde desejaria deixar uma palavra escrita: não tinha caneta e não se
devem riscar os espaços brancos, para não perturbar a sua imaculada brancura.
Quando
me viro, troço da minha sombra que caminha agora atrás de mim.
Desta
vez o sol inunda de frente todo o meu ser, murmurando ao meu ouvido:
-
Vou fazer um acordo contigo: passarás a sentir todo este calor e esta luz com
que te revisto da cabeça aos pés, mas vais distribuí-la por todos aqueles com
quem te cruzares no caminho, conhecidos ou estranhos.
Sorri e acedi ao seu pedido. Os passos
tornaram-se mais leves. Cheguei-me mais para o lado do mar, enquanto o ia
deixando ficar para trás… ouvia o seu marulhar sereno e constatei que os dois,
mar e céu, vestiam da mesma cor. Quando passei pelas palmeiras, as cigarras
calaram-se para que escutasse não só o mar, mas as gaivotas e os pensamentos
que caminhavam comigo. Era altura de regressar. Caminhávamos os três, o sol a
minha sombra e eu, mas esta ainda não foi a caminhada sem destino que um dia farei.
Adalberta Marques
2015-09-08
O BANCO
(Memórias de
outros Tempos)
Quando eu era peqenita, ia
muito ao Jardim Guerra Junqueiro, mais conhecido por Jardim da Estrela, que
ficava relativamente perto da minha casa. Nesse espaço tão bonito existiam
árvores muito robustas, muito altas e muito antigas… pareciam que chegavam ao
céu. Olhava para elas e pensava: - São mais velhas do que eu!
O jardim era muito grande e, além das árvores,
tinha flores de muitas cores e quatro enormes lagos, dos quais um era o meu
favorito: tinha no meio uma estátua, à qual chamavam “a guardadora de patos”.
O lago estava cheio de peixes
vermelhos enormes e patos a quem eu dava os quadradinhos de pão que a minha mãe
arranjava para eu levar. Os pombos que por ali esvoaçavam também aproveitavam
alguns deles.
Enquanto eu me divertia a
distribuir o pão, a minha mãe sentava-se num banco, que ficava entre o coreto e
o lago, à espera que eu acabasse de dar comer aos peixes e fosse para junto
dela, pois o lanche esperava pela minha vontade de o fazer desaparecer num
instante.
Anos mais tarde, fui
visitar o jardim de propósito: fui àquele lugar para ver se ele ainda existia.
O banco lá
estava
sempre no mesmo sítio…
Sentei-me e comecei a recordar
como ele passava os seus próprios dias.
Assistia, contente, à
chegada das crianças da escolinha, que logo pela manhã alegravam o jardim com
os seus risos e a sua gritaria.
Rodopiavam como andorinhas loucas sem qualqur
preocupação, corriam coreto abaixo coreto a cima, umas atrás das outras,
parecendo um velho combóio numa marcha frenética sem saber onde iria parar.
Riam imenso das suas bricadeiras.
Eram tão engraçadas!... Todas
de bibe e chapéu na cabeça.
Pareciam flores coloridas que
alegravam a chegada da Primavera.
O banco lá estava
sempre no mesmo sítio…
Os dias iam passando, até que
o calor veio de repente e as manhãs deixaram de estar mais frescas e passaram a
uma temperatura mais elevada, que se fazia sentir até no próprio banco.
Nem as árvores, suas
companheiras de tantos anos, com a sua sombra, de nada lhe valiam. Passava
gente e mais gente toda cheirosa, com roupas leves, a passos largos.
Realmente, tinha chegado o
Verão.
O banco lá
estava
sempre no
mesmo sítio…
As crianças, como sempre, vieram a seguir e foram direitas à beira do
lago, e com as suas pequenas mãos em concha enchiam -nas de água e atiravam-na
umas às outras, refrescando-se enquanto brincavam.
Mesmo com a temperatura um
pouco quente do sol da manhã, ninguém as parava: saltavam alegres e satisfeitas
e, de vez em quando, voltavam ao lago , repetindo as molhadelas e assim se iam
refrescando.
Um pouco mais tarde, um
sininho tocou e todas as crianças se perfilaram e lá foram elas, quais
soldadinhos de chumbo, de regresso à escolinha para o almoço e a soneca da
tarde.
O tempo passa a correr ,e repentinamente,
as folhas das árvores começaram a ficar douradas e a cair. O chão estava
repleto delas, assim como o banco.
Os dias tinham-se tornado mais pequenos, anoitecia
mais cedo.
Já não havia quase ninguém
no jardim, os candeeiros começavam a acender…
Também o vento apareceu
bem frio e a fazer remoínho com as folhas caidas, os pássáros fazendo um
barulho enorme com os seus chilreios, parecia que voavam mais depressa, para se
abrigarem nas árvores.
Era o Outono.
O banco lá estava
Sempre no mesmo sítio…
O céu escureceu e as nuvens
pareciam tão cheias, que poderiam rebentar a qualquer momento e jorrar toda a sua
água pelo jardim.
O ar fresco, que até aí se
fez sentir, deu lugar a um ar muito frio.
As poucas pessoas que passavam
quase corriam com receio duma valente chuvada.
Então, pelo portão do
jardim, entrou um velho muito velho que vestia um casaco comprido já roto, trazia
na cabeça um gorro e nas mãos umas luvas de lã já gastas pelo uso; trazia
também uma bengala onde se apoiava e um grande guarda-chuva.
Sentou-se no banco e ali
ficou calado e pensativo… estava tão cansado, que se deitou e acabou por
adormecer. Assim o pobre banco, que também já não era novo, acabou por se
sentir mais quentinho, com o calor do seu companheiro.
Tinha aparecido o Inverno.
O banco lá estava
Sempre no mesmo sitio…
As crianças aparecem mesmo
com o frio que se faz sentir, chegam ao jardim todas encasacadas e com os seus
gorros a taparem as orelhas e luvas quentinhas nas mãos. Mesmo vestidas assim, ainda
brincam e fazem o barulho habitual, só que regressam mais cedo à escolinha onde
começam a aprender e a descobrir muitas coisas.
O tempo vai passando sobre
todos nós, mas foi sentada naquele banco que tive alguns dos melhores momentos
da minha infância, da minha juventude, e porque não de adulta?
Por isso, ele foi e será sempre
tão especial para mim. Se falasse teria, com certeza, muitas histórias para
contar.
Se alguém de nós fosse hoje ao Jardim da Estrela, ele estaria lá
no seu espaço para nos receber, esperando que nós nos sentássemos um pouquinho,
a fazer-lhe companhia.
E o banco continua
Esperando ano após ano,
A chegada das quatro estações…
Azeitão,
Setembro de 2015
Carmo Bairrada
-Ó
Vulto… Vulto…
-Não
te consigo ver,
Está
muito escuro.
Quem
és?
Donde
vens?
Para
onde vais?
Tu
não falas?
És
muito estranho!
-Diz-me
qualquer coisa…
Andas
sozinho pela noite
Em
sítios de arrepiar,
Que
andas a fazer?
-És
alto, que trazes na mão?
Não
queres mesmo
Falar,
pois não?
-Os
teus passos entrelaçam-se
Nas
pedras do caminho…
-Não
estás cansado
De
tanto andares?
-Senta-te
um pouco…
Olha
p’ra mim,
Quero
ver a tua cara.
Anda,
chega aqui!…
Vira-te,
não tenhas receio,
Sou
só uma jovem de 15 anos…
-Se
estás tão determinada, diz-me: ”COMO TE
SENTES HOJE?”
-Bem, porquê?
-Nada…
nada…
Vou
voltar-me.
Para
que me vejas…
Acho
que me vais conhecer!
-Ó
meu Deus!
Não!
És
a Morte!
Vens
buscar-me?
-Sei
que és parte
Inevitável
da vida.
-Sei
também,
Que
nasces connosco, e
Connosco
caminhas, por todos
Os
instantes dessa vida,
Mesmo
que tentemos ignorar-te.
-Tem
piedade da minha juventude,
Agora
não… não… larga-me!
Não
te vou acompanhar.
Dá-me
mais tempo.
-Sai
daqui!
Segue
o teu caminho,
Até
às profundezas da terra.
Vai,
vai p’ra bem longe…
Adeus
Morte!
Até
daqui a 100 anos….
Azeitão,
Setº. 2015
Carmo
Bairrada
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