domingo, 2 de junho de 2019

Reflexões sobre o "Sermão do Bom Ladrão, Padre António Vieira (por Adalberta Marques)


A Intemporalidade das palavras

Dinamizadoras, inspiradoras... castradoras, promovedoras de paz, as palavras podem ter conotação diferente para quem as oiça: cada um dar-lhes-á a sua.
Qualquer vento as pode levar, no entanto outras permanecem actuais através dos séculos, tais como as do padre António Vieira, segundo Fernando Pessoa, «Imperador da língua portuguesa». E permanecem.  Após séculos. 
Segue breve reflexão sobre o "Sermão do bom Ladrão", pregado na sexta-feira santa de 1655, na então Igreja da Misericórdia de Lisboa, hoje Igreja da Conceição Velha:
- «Nem os reis podem ir ao paraíso sem levar consigo os ladrões, nem os ladrões podem ir ao inferno sem levar consigo os reis». Zaqueu e Dimas, bom e mau ladrão, nenhum poderia ir ao paraíso. O bom ladrão porque tinha para restituir e não o fazia, o mau ladrão porque não tinha para restituir, não era baptizado e apenas o seu sangue o podia redimir.
Os maus ladrões hesitam em roubar para mitigar a fome dos seus. Não restituem! Já roubaram porque não tinham, logo pagam com a sua liberdade…
Os outros, não! Os bons ladrões roubam impunemente ,não restituem e ainda que o fizessem não seriam de considerar as suas restituições. Para além delas, já estariam o desespero e danos morais a quantos os causaram. Pregasse hoje o Padre António Vieira e só teria que alterar algumas das palavras: não seriam ladrões, mas desviadores de fundos; os fundos seriam destinados aos sacos. Um saco de qualquer cor, poderia ser qualquer uma desviada do arco - íris. Não haveria apenas um paraíso onde estava Cristo e os dois ladrões, mas vários paraísos para o percurso dos sacos…
«A lei da restituição é lei natural e lei divina. Enquanto lei natural obriga aos reis porque a natureza fez iguais a todos; e enquanto lei divina também os obriga, porque Deus que os fez maiores que os outros e é maior que eles»


Adalberta Marques

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