quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Trovadores e Jograis

O Trovador
Vem de longe e longe vai
O Trovador p’lo caminho
Empoeirado e sombrio
Sapatos gastos na lama
Ao ombro manto rasgado
Viola velha no saco
E o cabelo em desalinho

Vai assim de vila em vila
Já não mede légua feita
De tantas e tantas são
Caminha sempre sem pressa
E chega sempre de noite
Seja inverno ou seja estio
A procurar uma deita

Procura o senhor da terra
Ou o príncipe ou o conde
Para tentar alguma  paga
Aos seus serviços bizarros
Cantorias e baladas
Poemas e brejeirices
Aprendidas não sabe onde


Não se lhe sabe a idade
Vem da terra do além
E ninguém o reconhece
Fala pouco, canta muito
Sorri com um ar cansado
Agradece alguma esmola
Sabe Deus de onde ele vem

Mas tem ternura no olhar
E o seu cantar é de amor
E fala de primaveras
De mares nunca visitados
De passarinhos, jardins
E de mil coisas bonitas

E às damas dá uma flor...

Mercedes Ferrari
outº 2015

O LAMENTO DE UM JOGRAL

Ai Deus!

Calma está a minha amada
Num banco de pedra fria,
Naquele jardim deitada,
Tão tranquila eu diria:

A minha amada dormia
Se não fosse aquele olhar,
Longínquo e calmo mar,
Já ela morta estaria.

Ai Deus!

Ao vê-la assim tão parada,
Olha e não vê ninguém,
Parece enfeitiçada
Pelas mezinhas d’alguém…

Minha amada adormeceu
Debaixo de um sol vibrante
Que sobre ela desceu
E a acordou num instante.

Ai Deus!

Ó minha amada!
Que falta sentes?
Se é de mim
Não mentes.

Estou tão perto de ti
Que nem dás p’los meus passos
Eu assim nunca te vi
Quando voltas aos meus braços?

Teus olhos estão parados
Não sei que feitiço têm
Estão eles acordados,
Só que eles não me vêem.

Ai Deus!

Vou tirar-te esse feitiço
Que algum mago te fez
Tenho como compromisso
Levar-te daqui, de vez.

Não conseguiu o que queria
Só lhe deixou um cristal
A tristeza ficaria
No coração do jogral.

Azeitão 30/10/2015
Carmo Bairrada


“TROVAS DE TODOS OS TEMPOS”

Chegaram até nós os ecos duma cultura poética, de origem desconhecida, que encontrou nos jograis o elo de ligação entre as palavras e a música: Cantigas de amigo! Lamentos, por vezes motivados pela distância social, que se interpõe entre o cantor e o ser amado ! Outras vezes, é apenas a exaltação da beleza física, que entra em comparação com a candura das aves e das flores!    “Teus olhos senhora minha
                   São alfazema campestre,
                   Cândido como uma rolinha
                   Teu belo rosto se veste!”
(Cancioneiro Tradicional)
Inicialmente, as donzelas parecem ter começado esta “batalha poética”, aí por volta do século XIII. “Airas Nunez de Santiago “ dá-nos testemunho dessa poesia  no feminino! Nossa contemporânea, a escritora Natália Correia, Em “O Sol nas Noites e O Luar nos Dias,” deu vida a um belo poema escrevendo :

              “Passais como queimaduras
              E tudo em fogo deixais!
              Já luzem as galas
              Do Maio florido.
              Iria à bailada
              Mas não tenho amigo.” 

Ao talento e engenho de José Régio, não escapou também um Cantar de Amigo!

            À beira do rio fui dançar…Dançando
            Me estava entretendo
            Muito a sós comigo
            Quando na outra margem como se 
            Escondido
            Para que eu não visse que me estava
            Olhando,
            Por entre os salgueiros vi o meu amigo!
A poesia tem passado através dos séculos, não só através da Literatura institucional (cantigas de amigo, por exemplo), mas também através de bailes de roda e modas que se popularizaram, cantadas por homens e mulheres nos trabalhos, nos campos !Quem não conhece ou não cantou, do cancioneiro Alentejano?
             Menina estás à janela
             Com o teu cabelo à lua,
             Não me vou daqui embora
             Sem levar uma prenda tua!
Cantares de Amigo, bailes de roda, canções de amor…
Dêem-lhe o nome que a época exige, ou chamem-lhe o que quiserem! Para mim, o que me alimenta é a aliança entre a poesia e  a música e a expressão cultural dos povos que delas se servem e fazem uso!...

Elita Guerreiro 11/10/2015

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