sábado, 1 de outubro de 2016

Inéditos de Carmo Bairrada


OUTONO

Este ano chegaste
com uma réstia de Verão,
apesar de já se verem pelo chão
folhas caídas, umas douradas,
outras avermelhadas,
sente-se que estás entre nós:
os dias são mais curtos,
as noites mais frescas.

Este ano, o Sol teima
em não te deixar.
Ainda deu para ir até à praia,
quase ao fim da tarde… o mar
parecia um grande lago…
Só se dava por ele, quando
se ouvia o chapinhar da água
junto à areia e ás rochas, que
por ali estavam ainda iluminadas,
e onde algumas gaivotas gozavam
os últimos raios de sol e outras
dançavam de um lado para o outro,
lançando para o ar os seus gritos
habituais.


Deixei para trás o eterno murmúrio
do vai e vem da água. De regresso
a casa, para terminar, a Mãe Natureza
presenteou-me com o pôr-do-sol,
que nesta época do ano
está tão baixo que quase não
dá tempo para lhe tirar uma foto.

É nesta altura do dia que gosto de
apreciar as cores fortes e exuberantes,
que o sol, ao despedir-se, nos deixa…
como  uma alquimia de alma,
transportando-nos consigo
para o outro lado do Mundo,
onde outro dia se renovará.

Outono, sejas bem-vindo!
Já que o Verão este ano
foi muito castigador,
espero que tragas contigo
um regador para dares de beber
aos campos fustigados pelos fogos
e não um rio caudaloso e turbulento.
Só te peço uma única coisa,
Prudência…


Azeitão, 24-09-2016

Carmo Bairrada



Ó S. Martinho do vinho
Talvez venhas a ter sol,
Não vás por outro caminho,
‘ Tá um frio do “briol”.

Que bela castanha assada
P´las ruas se vai comendo,
É ver a rapaziada
O que já anda fazendo.

Coitadas das raparigas
Não conseguem descansar,
Andam fugindo das brigas,
Com saias a dar, a dar.

A partir da meia-noite
Outro galo cantará,
Aí vão elas p´rá “boite”.
P’ra dançar o Xá-Xá-Xá.

Cheiras a vinho barato,
Tinto ou branco tanto faz,
Sobe já lá para o quarto,
Vamos fazer um “rapaz”.

Depressa, vem por favor,
Que não vou mais esperar…
O que tu tens é pavor
De não poderes escapar.

P’ró ano seremos três,
Agora, cala-te lá!
Aproveita desta vez…
Estás a ouvir-me, pá?

As castanhas e o vinho
Andam sempre de mão dada,
No dia de S. Martinho
É que nos dá a “pancada”…

S. Martinho, S. Martinho
Esta festa está a acabar,
Com castanhas e bom vinho
Para o ano vais voltar.

ATÉ P’RÓ ANO !!!!

Azeitão, 11-11-2016

Carmo Bairrada


É DIA DE S. MARTINHO

Ó pipas belas e cheias,
Do néctar, que nós pisámos!
Descalços e já sem meias
Foi assim que começámos.

É dia de S. Martinho,
Com castanhas a estalar,
Provem todos deste vinho,
Bebam até acabar!

Que dia maravilhoso
Neste V’rão de S. Martinho!
Venha de lá um jeitoso,
Com vinte copos de vinho.

Primeiro prova-se o novo,
Fica o velho p’ra terminar
P’rós lados de Porto Covo,
Estão todos a aboborar!

Com bebedeiras tão grandes,
Ninguém sabe o que diz.
Pelo ar passam as sandes,
E um tacho com perdiz.

Ó Baco abençoado,
Tens as honras neste dia…
Não há deus mais afamado,
Para tamanha alegria!

Mais um ano que passou,
Outro estará para vir.
O vinho já abafou,
São horas de ir dormir!

Azeitão, 11-11-2017

Carmo Bairrada



Dia dos Namorados: S. Valentim

O teu dia já chegou
Que bom é apareceres
Eu ainda não estou
Vistosa para me veres.

É um dia especial
Termos tempo p’ro Amor
Que é chama em espiral
Que se sobe com fulgor.

Não tragas muitas oferendas
P’ra não errares o caminho
Toma atenção não te prendas
Demais por qualquer beicinho.

Ó Valentim, Valentim,
És poço de tentações
Gasta-se o perlimpimpim
E ficamos sem calções.

Que tal estarão as pernas
Nesse dia de amores?
Dia de juras eternas
Ouvem-se muitos rumores.

Por essas ruas inteiras
Se diz ser bom o teu dia…
Para todas as solteiras
É um dia de folia.

Um belo ramo de flores
Vais levar a quem amou…
Nascida dos teus clamores
Uma criança palrou!

Tantas horas já passadas,
Há crianças no jardim,
Nos carrinhos estão sentadas
P´ra te verem, ó Valentim!

Esta história é tão bonita
Que se pode repetir
Teremos papel e tinta
P´ro desejo te pedir.





“VENDAVAL”  

Chuva, Vento, Trovoada!
Jardins, quintais e hortas
Tudo transbordava de água.
As ruas pareciam pequenos
braços de rios que corriam
Tão depressa, junto
às nossas portas e muros.

Chuva, Vento, Trovoada!
As árvores abanavam, dobravam
Partiam-se e lá iam elas na
Enxurrada.
Só paravam nas primeiras rodas
De algum carro, que estivesse parado.
Os pássaros não se viam
Nem se ouviam.
As pobres flores, coitadas!
Com o fustigar dos ventos,
Eo peso da água sofriam,
Enquanto as mais novas
ficavam agarradas à terra
dos seus vasos de barro
Com a força de quem é jovem.
As mais velhas estavam
Caídas no solo, sem qualquer préstimo.

Chuva, Vento, Trovoada!
A trovoada já se ouvia,
Estava cada vez mais perto.
De repente, um trovão estalava
Mesmo por cima da casa…
Toda a gente ficou sem luz,
Parecia que a noite chegara.
Foi muito forte, tão forte que
Ficámos totalmente às escuras.
Eu corria para o quarto dos meus pais,
Escondia-me debaixo de uma grande
Almofada para não ouvir trovejar.
Hoje penso como é que eu
Conseguia respirar…

Isto era assim, todos os Invernos
da minha infância,
Onde dias como este se seguiam,
Uns atrás dos doutros, durante
Os meses de Março e Abril.


Até as pessoas diziam:
- “Março, Marçagão, de manhã Inverno,
Á tarde Verão”  e
- “Em Abril, águas mil.”

Realmente em muitas tardes de Março
Aparecia um sol muito tímido, que ajudava
A secar a roupa. Os pássaros apareciam
E faziam um grande chilreada, dando
Asas às suas próprias asas, parecendo terem
Enlouquecido de alegria.

Como me lembro
Tão bem destas cenas!
São coisas antigas, que por vezes
Nos saltam à memória e que estão
Guardadas nas gavetas do nosso cérebro,
Que, às vezes, se abrem para
Apanhar um pouco de ar fresco.


Azeitão. 03-03-2018
Carmo Bairrada


 “MULHER”


És tu que dás ao mundo um SER.
És tu que está sempre presente na
Felicidade ou no infortúnio.

És tu que atravessas todos os destroços
De vidas, de muitas vidas perdidas,
À custa da própria inocência.

És tu com a tua força interior,
Que te leva a ir até onde podes,
Que passas do medo à vergonha,
Que te leva a esconderes-te de todos
E de tí prória.

O Mundo em que vives é que dita
as regras de como deves agir
E que te leva ao engano.
Tu como Mulher mostras obediência
E servilismo. Em que mundo vives tu?
Terás que dar o passo
Para que haja uma renovação.
Basta de preconceitos!

Enquanto existir uma mulher sobre a
Terra, a Humanidade não desaparecerá!
Quando esse dia chegar, saberás o que
Queres e para onde queres ir e vais ter
Alguém à tua espera e assim renascerás
Do caos.
Depois só tens que soltar o que está
Adormecido dentro de ti.

Então serás livre e rebentarás as amarras,
Que durante muito anos carregaste.
Vais sentir a leveza do teu corpo
E do do teu espírito.
Gritarás ao vento, até que a tua voz te doa…


LIBERDADE, LIBERDADE, ONDE ESTÁS?


Azeitão, 08-03-2018

Carmo Bairrada



CASTANHA VAIDOSA
Uma castanha vaidosa
Levada por um Toyota
Acercou-se d´um sobreiro
Pr´a roubar uma bolota.

Vê a castanha vaidosa
Que d´automóvel andava,
Viu um mundo cheio de sol
Não aquele que imaginava.

Olha a castanha vaidosa
Com janela aberta ao vento,
Tinha consigo a bolota
Num embalo ternurento.

Ela, castanha vaidosa
Deixou-se adormecer,
Sonhava alto a castanha
Sem ninguém a perceber.

Uma castanha vaidosa
Não se vê em qualquer dia,
Neste mundo tão diferente
Apenas ela existia…

Azeitão, 09-11-2018

Carmo Bairrada

ESTRANHO OUTONO

Bateram ao meu portão
Fui ver quem batia assim
Era mesmo o senhor Verão
Que vinha passar seu fim.

Sé é o fim, não me parece,
A muito custo acredito
Quem não aparece esquece
É um ditado bem dito.

As minhas folhas caídas
Já não ouvem a sinfonia
Estavam muito feridas
Numa espécie de agonia.

Sentir os passos de alguém,
Que por cima delas passavam
Era um alegre vaivém
Das folhas que se quebravam.

O Outono foi já tão mágico,
Produziu grandes vibrados,
Agora está tão trágico,
Farrapo de tempos passados.


As folhas que já cairam,
O tempo as levou de viagem
Agora que já partiram,
As restantes são miragem.

Sou Árvore velha chorando,
O meu porte é de altivez
Tenho sede, estou esperando
Que a chuva volte outra vez.

Tudo deve ter seu tempo,
É p´ra isso, que crescemos
Se o tempo não vem a tempo,
não vale a pena nascermos.


Azeitão,  01-10-2018
Carmo Bairrada

Ó PRIMAVERA!

Perguntei ao tempo
Por onde andavas e o
Tempo respondeu:
- Há-de chegar… há-de chegar…
Apareceste tímida vestida de Outono
Depois cinzenta, com réstias de Inverno…
Agora sim, estás connosco
No teu esplendor!
Os campos respiram já a tua presença,  
As tuas cores, qual paleta de um pintor,
Passam dos pincéis para a tela…
Dá gosto ver a Natureza no seu despertar.
Os prados estão tão belos….
É o vermelho vivo das papoilas,
É o branco e amarelo dos pequenos malmequeres,
São os roxos e lilases da alfazema, dos lírios,
Dos cardos em flor.
É um Universo que nos inebria os sentidos.
Ó PRIMAVERA!

A vida sem ti nunca faria sentido.
És a companheira de todos aqueles,
Que amam a Natureza no seu melhor.
Transportas contigo um ciclo de Vida,
De Renascimento, por isso terás de
Voltar sempre ao equilíbrio da
Terra-Mãe.
Nunca te esqueças disso, volta sempre,

Ó PRIMAVERA!

Azeitão, 15-05-2019
Carmo Bairrada

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