terça-feira, 1 de outubro de 2013

Sebastião da Gama: percurso I

NASCER
Pequeno poema

Quando eu nasci,
ficou tudo como estava.

Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve Estrelas a mais...

Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.

As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...

Pra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...
Sebastião da Gama, Serra-Mãe

BRINCAR...
Nasci p'ra ser ignorante
Nasci p'ra ser ignorante
Mas os parentes teimaram
E dali não arrancaram
Em fazer de mim estudante
Que remédio obedeci
Há já 3 lustros que estudo
Aprender aprendi tudo
Mas tudo desaprendi

Perdi o nome às estrelas
Aos nossos rios e aos de fora
Confundo fauna com flora
Atrapalham-me as parcelas
Mas passo dias inteiros
A ver o rio a passar
Com aves e ondas do mar
Tenho amores verdadeiros

Rebrilha sempre uma estrela
Por sobre o meu parapeito
Pois não sou eu que me deito
Sem ter falado com ela
Conheço mais de mil flores
Elas conhecem-me a mim
Só não sei como em latim
As crismaram os doutores

Nasci p'ra ser ignorante
Mas os parentes teimaram
E dali não arrancaram
Em fazer de mim estudante
Que remédio obedeci
Há já 3 lustros que estudo
Aprender aprendi tudo
Mas tudo desaprendi

Enquanto as águas correrem
Não sentirei calafrios
Que flores aves e rios
Ignorante é que me querem
Que flores aves e rios
Ignorante é que me querem

Sebastião da Gama, Cabo da Boa Esperança

CRESCER

Cantilena 
Cortaram as asas
ao rouxinol
Rouxinol sem asas
não pode voar.

Quebraram-te o bico,
rouxinol!
Rouxinol sem bico
não pode cantar.

Que ao menos a Noite
ninguém, rouxinol!,
ta queira roubar.
Rouxinol sem Noite
não pode viver.

Sebastião da Gama, Cabo da Boa Esperança

LUTAR
Meu País Desgraçado
Meu país desgraçado!...
E no entanto há Sol a cada canto
e não há Mar tão lindo noutro lado.
Nem há Céu mais alegre do que o nosso,
nem pássaros, nem águas ...

Meu país desgraçado!...
Por que fatal engano?
Que malévolos crimes
teus direitos de berço violaram?

Meu Povo
de cabeça pendida, mãos caídas,
de olhos sem fé
— busca, dentro de ti, fora de ti, aonde
a causa da miséria se te esconde.

E em nome dos direitos
que te deram a terra, o Sol, o Mar,
fere-a sem dó
com o lume do teu antigo olhar.

Alevanta-te, Povo!
Ah!, visses tu, nos olhos das mulheres,
a calada censura
que te reclama filhos mais robustos!

Meu Povo anémico e triste,
meu Pedro Sem sem forças, sem haveres!
— olha a censura muda das mulheres!
Vai-te de novo ao Mar!
Reganha tuas barcas, tuas forças
e o direito de amar e fecundar
as que só por Amor te não desprezam!
Sebastião da Gama, Cabo da Boa Esperança

AMAR

Madrigal

 A minha história é simples.
A tua, meu Amor,
é bem mais simples ainda:

"Era uma vez uma flor.
Nasceu à beira de um Poeta..."

Vês como é simples e linda?

(O resto conto depois;
mas tão a sós, tão de manso
que só escutemos os dois).

Sebastião da Gama, Cabo da Boa Esperança
MORRER
Romântico


Olha,
quando vieres, Morte!
não venhas sorrateira.
Quero sentir-te bem;
levar bem nítido, nos lábios,
o travo do teu beijo...

Chorem os outros, Morte!, a dolorida
minha hora final.
P’ra mim, que bom saber até ao fim
a que é que sabe a Vida!...



Sebastião da Gama, Serra-Mãe
VIVER

O SONHO
Pelo sonho é que vamos,
comovidos e mudos.

Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.


Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia a dia.


Chegamos? Não chegamos?

 - Partimos. Vamos. Somos.
Sebastião da Gama, Pelo Sonho é que Vamos

SER

BIOGRAFIA

Morremos em cada rosa …
Fugimos em cada rio…

Mas nascemos
Em cada rio que nasce.

Mas abrimos
Em cada botão de rosa.

Sebastião da Gama, Estevas
 
















 





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